Estou limpando meu armário e retratos do meu passado voltam à me assombrar. Sua moldura dourada não disfarça a foto rasgada ali, a poeira, as mágoas esquecidas que enterrei-me para expulsar.
Vasculho dentre as gavetas, lembranças. Feridas. Sangue. Tinta. Dor. Sorrisos. É engraçado como um misto de sentimentos e fantasias podem estar guardados - eu diria que quase secretamente - dentro de gavetas carcumidas e emboloradas. As roupas que tu deixou, ainda estão aqui. Elas têm bolor e traças emboladas em si, mas ainda sim, posso olhá-las e ver teu rosto; exatamente como ele é. Distorcido. A desconfiguração de uma imagem mescla o foco da sujeira que tirou o brilho dos seus olhos (e eu nunca disse que não estava falando de mim). Mangas, meus livros. Camisinhas, camisinhas e mais camisinhas. Olha só! Temos até mesmo uma usada! Nota mental: contratar uma empregada.
Ao menos seria ela a ouvir os gritos do garotinho caído em meio a rua, o joelho fodido e o sangue manchando a calçada. Seria ela a ouví-lo - agora já mais velho - mandando os pais para a casa do caralho e indo embora, com cinco dólares no bolso e uma mala de sonhos - e acredite, eles se realizam. Veria-o também, já adulto, vida feita, dinheiro, fama, mulheres (o que não quer dizer que ele tenha que gostar, uh?) caído frente ao box do chuveiro, bêbada. As agulhas enfincadas na pele, o suor na testa e os hematomas espalhados pelo corpo pálido. Uma vez alcoolizada, sempre alcoolizada. Mas de repente, os entorpecentes não fora o que o prejudicou. Descobrira ainda a pouco, qual vício o fizera mais mal: ele. E agora, vasculhando seu armário, eu encontro suas memórias. Aquela aliança - que ficara ali, durante seis longos meses -, suas transas, suas declarações. Foi o primeiro, mas foi o que realmente amou. O que realmente desejou e talvez nunca páre de querer em sua cama, noite pós noite. É ele. Somente ele, e mais ninguém.
O moreno de olhos puxados, cabelo baixinho, o rosto delineado por seu contorno, sem tatuagens ou vestígios de alguém que precisa se esconder - exceto é claro, seus óculos escuros -. Foi ele. É ele. Vai ser pra sempre. O homem que desejou para si, mas que perdeu. Um bastardo desgraçado, que levou o coração do viajante consigo e nunca voltou para devolvê-lo. Bastardo!Limpeza feita, é só uma faxina. Atiro minhas emoções no tambor de lixo, junto de tudo aquilo que um dia foram parte de minha vida. Todos os sonhos, as transas, os sorrisos; todos os sentimentos, os momentos. Todas as intoxicações. Inclusive você.
Um novo recomeço.
terça-feira, 20 de outubro de 2009
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